melhor saber distingui-la:
Os índios
não dividem corpo e alma. O corpo está na alma, a alma está no corpo. Tudo
junto misturado povoa a alma. A família,
os amigos, o mundo virtual, o mundo real, o jornal impresso, a fala do rádio, o
ruído da cidade, a qualidade do ar e da água.
O mundo é
cruel, nunca foi justo.
Seríamos
capazes de enumerar quantas vezes nos sentimos ameaçados? A partir de que
idade? Será, que assim como os afagos,
as tensões não se encontram todas gravadas em alguma parte de nosso corpo?
Se está à
procura de uma confissão que salve tudo
ela não
existe,
que baste
uma consciência
ou nova
postura
que caiba
nesse vestido d’alma
finesse e fissura
que seu
corpo acolheu.
"O
enraizamento é talvez a necessidade mais importante e mais desconhecida da alma
humana. É uma das mais difíceis de definir. O ser humano tem uma raiz por sua
participação real, ativa e natural na existência de uma coletividade que
conserva vivos certos tesouros do passado e certos pressentimentos do futuro." Simone Weill
Às vezes,
em dias de luz perfeita e exata,
Em que as
cousas têm toda a realidade que podem ter,
Pergunto a
mim próprio devagar
Porque
sequer atribuo eu
Beleza às
coisas.
Uma flor
acaso tem beleza?
Tem beleza
acaso um fruto?
Não: têm
cor e forma
E
existência apenas.
A beleza é
o nome de qualquer coisa que não existe
Que eu dou
às coisas em troca do agrado que me dão.
Não
significa nada.
Então
porque digo eu das coisas: são belas?
Sim, mesmo
a mim, que vivo só de viver,
Invisíveis,
vêm ter comigo as mentiras dos homens
Perante as
cousas,
Perante as
cousas que simplesmente existem.
Que difícil
ser próprio e não ver senão o visível!
XXVI - Às
vezes, em dias de luz perfeita e exata, Poema de Alberto Caiero, Fernando
Pessoa, obra poética, ed. Nova Aguilar, 1992
“Uma das tarefas mais importantes de uma filosofia e de uma literatura é a de conseguir flagrar e construir a afetividade, a sensibilidade e o espírito de sua época, oferecendo-nos o que por permanecer estranho, todos temos tanta dificuldade de enxergar apesar de ser o mais íntimo de todos nós. “Redesenhar o mapa da sensibilidade”, com o qual cada momento histórico deve a cada instante, se medir, criando o inventário dos novos sentimentos e pensamentos, criando portanto, a própria época, é a aposta a que se lança toda grande obra.”
(...) criar o que não existia antes: “ o inteiro mundo, em eterno crescimento, de avaliações, cores, pesos, perspectivas, degraus, afirmações e negações.” Alberto Pucheu
título: Jou Jou Balangandã de Lamartine Babo
Finesse e Fissura, poemas Ledusha, Ed. Brasiliense, 1984
Simone Weill
Giorgio Agamben: Poesia, Filosofia, Crítica, Alberto Pucheu, Ed. Azougue, 2011